Por: Cineide Pereira.
O prestigiado procedimento de arbitragem em recuperações de empresas visa atenuar os conflitos de forma mais célere já que as demandas judiciais tendem serem morosas já que perpassam por várias etapas processuais até sua finalização. Aliado ao fato que, na arbitragem podem as partes eleger árbitro que seja expert no assunto trazendo uma maior segurança no procedimento de arbitragem.
A reiterada jurisprudência da Corte Superior, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, durante o enfrentamento do REsp 1.953.212-RJ, decidiu que nas ações movidas em face de empresas em recuperação judicial que demandam quantias ilíquidas devem tramitar regularmente onde foram propostas, inclusive aquelas submetidas a juízo arbitral, até a apuração do montante devido, nos moldes do art. 6º, § 1º da Lei n. 11.101/2005.
O art. 6º, § 1º da Lei 11.101/2005, estabelece o seguinte:
Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica:
[…]
§ 1º Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida.
Assim, o supramencionado artigo não condicionou a competência do juízo recuperacional unicamente para apuração de eventuais créditos (concursais ou extraconcursais), determinando que, até a apuração do montante devido, as ações movidas contra empresa em recuperação judicial devem seguir se curso regular.
Ainda, sobre a convenção da arbitragem a Lei nº 11.101/2005 sofreu algumas modificações trazidas pela Lei nº 14.112/2020, vejamos o disposto no art. 6º, § 9º, dispõe o seguinte:
Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica:
[…]
§ 9º O processamento da recuperação judicial ou a decretação da falência não autoriza o administrador judicial a recusar a eficácia da convenção de arbitragem, não impedindo ou suspendendo a instauração de procedimento arbitral. (Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020). Grifos nossos.
Segundo a regra do kompetenz-kompetenz, incumbe aos próprios árbitros decidirem quanto a sua competência para avaliar a existência, validade ou eficácia do contrato que contém a cláusula compromissória como delineado no art. 8º, parágrafo único, e art. 20 da Lei 9.307/96. Vejamos:
Art. 8º A cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato em que estiver inserta, de tal sorte que a nulidade deste não implica, necessariamente, a nulidade da cláusula compromissória.
Parágrafo único. Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória.
Art. 20. A parte que pretender arguir questões relativas à competência, suspeição ou impedimento do árbitro ou dos árbitros, bem como nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, deverá fazê-lo na primeira oportunidade que tiver de se manifestar, após a instituição da arbitragem.
Nos ensinamentos da Roberto Portugal:
“Cláusula compromissória define-se como a convenção por meio da qual as partes comprometem-se, por escrito, a submeter à arbitragem os litígios, relativos a direito patrimoniais disponíveis, que possam vir a surgir, relativamente a um contrato. Destaca-se a autonomia da cláusula compromissória válida, em relação ao contrato em que está inserida. Uma vez existente cláusula compromissória válida, isso implicará em afastamento do Poder Judiciário (efeito negativo) e firmará a competência arbitral (efeito positivo). Dependendo, porém, da forma com o tenha sido estabelecida a cláusula compromissória , prescindirá do compromisso – cláusula valha compromisso – ou poderá, por ser estabelecida em termos gerais, não ter autossuficiência, ou ter relativa autossuficiência, situação em que se imporá com o necessário o compromisso”.[1]
A Jurisprudência do Tribunal Superior é uníssona que “é entendimento assente na jurisprudência desta Corte que a cláusula arbitral, uma vez contratada pelas partes, goza de força vinculante e caráter obrigatório, definindo ao juízo arbitral eleito a competência para dirimir os litígios relativos aos direitos patrimoniais disponíveis, derrogando-se a jurisdição estatal” (AgInt no AgInt no AREsp 1096912/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/2/2018, DJe 27/2/2018).
No caso em apreço a relatora asseverou em voto que a decisão proferida pelo juízo arbitral não reflete direta e imediatamente sobre o acervo patrimonial da recuperanda, uma vez que não se determinou a prática de qualquer ato constritivo contra ela.
Não é crível que a recuperanda após provocação do órgão arbitral e, depois de pronunciamento por aquele órgão julgador venha pugnar pela nulidade da respectiva decisão a qual provocou sua manifestação.
Precedentes: AgInt no AREsp 1.725.314/GO; CC 175.859/MS, REsp 1.960.574/MA, REsp 1.953.014/MG; AgInt no REsp 1.778.196/RS; AgInt no AREsp 1.372.134/SP, AgInt no AREsp 1.845.956/MT.
Por fim, entendeu a Min. Relatora Min. Nancy Andrighi, da Terceira Turma do STJ, que reconhecida à competência do órgão arbitral para processamento e julgamento da demanda perante ele proposta que se delimita a apuração dos créditos inadimplidos no âmbito do contrato de prestação de serviços celebrado entre as partes, não há falar em nulidade da sentença proferida.
[1] Bacellar, Roberto Portugal Mediação e arbitragem / Roberto Portugal Bacellar. – São Paulo : Saraiva, 2012. – (Coleção saberes do direito ; 53) 1. Arbitragem (Direito) – Brasil 2. Mediação – Brasil I. Título. II. Série (Pág. 130-131).
Cineide Pereira de Melo, Advogada, Associada do Escritório Eduardo Albuquerque Advogados Associados. Membra da Comissão de Direito Bancário OAB/PE desde (2020). Possui graduação em Direito pela Faculdade Estácio do Recife (2013), Especialização em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Faculdade Estácio do Recife (2019), Curso de extensão Arbitragem Empresarial pela PUC Minas (2020), Especialização em Direito Empresarial, Verbo Jurídico (2021), Curso de Educação Executiva pela FGV em Direito do Seguro e Resseguro (2021).